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Entre mangueiras e lembranças

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Uma crônica delicada e poética sobre reencontros com o passado. Caminhos da infância, árvores queridas, casas cheias de memória e o aconchego de um tempo que permanece dentro de nós. “Hoje me visitei — e fui casa, mangueira, jardim. Fui saudade em cada passo." Entre mangueiras e lembranças Revisito a rua da minha infância, as mangueiras do quintal, o colégio, o alpendre... Hoje me visitei. Vi a rua onde eu, criança, morei. Tudo igual, ao mesmo tempo que tudo mudado. Andei pela grande avenida até encontrar a praça — aquela praça. A praça aonde eu ia com meu pai, eu bem pequena, ele todo orgulhoso da filhinha quase neta. Ele me olhava com ternura, me mostrava aos amigos dizendo: "minha princesinha". Talvez por não ter acompanhado de perto o crescimento dos filhos de seu casamento anterior, quisesse compensar redobrando carinho e atenção aos filhos da idade madura? Não sei. A existência humana é um enigma. Nem sempre agimos como pensamos ser, como queremos ou sonhamos ser....

Elas passaram florindo

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  Elas floresceram. E depois partiram.   As flores vão, mas continuam a tocar quem passa Elas passaram florindo Presenças que florescem e se transformam em caminhos Há pessoas que passam pela vida da gente como flores dos ipês.   Chegam sem alarde, mas, quando florescem, é impossível não notar.   Têm cor, têm canto, têm riso fácil.   Fazem do cotidiano um quintal cheio de histórias.   Carregam a cultura de um lugar nos gestos, no sotaque, nos saberes.   E, sem pedir licença, espalham alegria como se fosse semente ao vento.   São aquelas pessoas que transformam o ar ao seu redor.   Você sabe: onde elas estiveram, alguma coisa floresceu.   Mas o tempo, que a tudo leva, também leva essas presenças.   E quando elas partem — cedo ou tarde, como todas as flores — não se vão por completo.   Porque certas pessoas, assim como os ipês, sabem deixar um tapete   Um tapete de lembranças.   De risos soltos no meio da rua. ...

Conto ‘Cobra Coral’: tragédia familiar no sertão em tempos de seca

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A literatura, muitas vezes, nasce da memória.  “Cobra-coral” é um conto breve, inspirado num  episódio real, sobre os riscos escondidos no cotidiano. “Cobra-coral" é uma história singela e dolorosa e o amor que une uma família em tempos difíceis.       Cobra coral Conto sobre tragédia familiar e vida no sertão   Era uma manhã de agosto. O sol amanheceu ardendo em labaredas, no azul tímido do céu, parecendo tingido com grossos rabiscos de corante de urucum. Galhos secos se retorciam no desespero de mais um dia sem chuva. Dona Zefa, acalorada ao pé do fogão, fervia água pro café da manhã e esquentava umas migalhas do pão de anteontem, atenta às vozes vindas da sala. O choramingar da pequena Lara, de sete meses, era acalentado por Dara, de seis anos. Seu João mexia no rádio. Sintonizava aqui e ali, mas a notícia sobre as queimadas de ontem vinha entrecortada por ruídos. Damião, de nove anos, arrumava seu caderno e um livro com meia capa — o que Dona Zefa cons...